terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Gente que faz

Meu nome é João Carlos, tenho 41 anos e moro na capital. Hoje contarei um pouquinho da minha profissão.
Sou vendedor. Aliás, eu falo que sou vendedor, mas na verdade nunca vendi nada.
Sou também um pouquinho ator. Pouquinho não, para falar a verdade, apareci na televisão mais que o Lima Duarte.
Não que eu seja melhor que ele, tudo bem, sou modesto. Mas é que eu não entro na “geladeira”. Meus contratos estão sempre na ativa. Apareço normalmente às segundas, quartas, quintas, sábados e quando há feriados, aos domingos também.
Meu horário é muito flexível. Posso até dizer que sou um exímio profissional no que faço. Talvez um dos melhores na área. (é o que todos em casa dizem).
Você já deve ter me visto. Eu sempre apareço tentando mostrar um grande interesse por móveis e eletrodomésticos.
Tente lembrar, qualquer grande loja de departamentos tem aquelas chamadas “Só amanhã” ou, “Oportunidade, amanhã descontos incríveis, você não pode perder!”.
Daí eu apareço.
Sorte a minha, porque os que fazem essas chamadas ou entram correndo com plaquinhas na mão, aparecem graças ao sucesso repentino, chamamos esses de “bola da vez”.
Ok, tem gente que diz que eu sou um ator “figurante”. Mas eu não concordo. Tenho um papel muito importante! Eu influencio as pessoas pelas minhas expressões. Costumo dizer até que muitos só compram pela minha cara de felicitação ou expressão de satisfação, desejo realizado. E olhem que eu nunca fiz aula para isso. Pois é! Eu digo a todos. O pessoal do ponto de táxi no final da minha rua diz que é um dom.
Assim que entra a vinheta e o “bola da vez” mostra os cartazetes “Só amanhã”, eu entro.
Sempre com alguns novatos e freelancers.
Percorremos o estúdio observando geladeiras, sofás, carros...
Mas deixo esses principiantes de lado. Já vou logo expondo minha exímia experiência em observar um eletrodoméstico que caberia em casa. Dou uma olhadinha na curvatura, na profundidade, (e o segredo, nunca pense no preço dele!), exibo minha expressão de satisfação, as vezes coloco a mão no queixo com um ar de “que maravilha!” .
O problema é quando a produção é alta, e tem muita gente entrando junto.
Os novatos não entendem a importância dessa profissão e vão avacalhando.
Percorrem correndo, não mantém a passada correta. Apontam o mesmo produto várias vezes para pessoas diferentes. Achando que por estarem lá atrás não aparecem.
Muita gente junto exige mais profissionalismo. Entro com tranqüilidade como numa feira. Muitos se perdem porque entram correndo e quando chegam no final do expositor, precisam voltar.
Pois é meus amigos, há pseudo-autores que nem mostrar o produto faz. Se perdem, deve ser pelo nervosismo. Entram correndo e só ficam andando pra lá e para cá.
Acaba o tempo, nosso produtor grita e esses não mostraram nada. Não venderam nada.
Só ficaram que nem barata tonta, correndo em volta das mercadorias.
Espero vocês no próximo anúncio. Hoje fiz a barba, e passei gel. Aparecerei de camiseta amarelo bem clarinha e calça jeans. Sapato mocassim e relógio no braço direito (para diferenciar dos demais).
Ate a próxima! (compra).

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