terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Apólogo do bem - Parte I

Num vilarejo de uma cidadezinha do interior, viviam em perfeita harmonia os velhos moradores da Rua Treze.
Luizinho ficava o dia inteiro na banquinha onde trabalhava como chaveiro.
Ela ficava num lugar estratégico, bem próximo a rodoviária, único local onde havia movimentação.

Seu trabalho se resumia basicamente em consertar os cadeados e vendê-los para os que estavam indo ou voltando e precisavam lacrar as bagagens.

O lado ruim é que a banquinha ficava entre morros, na única direção do vento, o que todos os dias resultava em prejuízos para a estrutura de seu ponto de vendas.

Aí entra Pedrinho.
Praticamente um faz-tudo, com especialidade em marcenaria. Vive de bicos.
T
odos os dias, preocupado com o bem estar de todos, em especial do Luizinho, uma vez que segundo ele, era desprovido de sorte na Rua Treze, se sentia obrigado a diariamente já implantar no seu itinerário fixar as madeiras, as vezes pintar e em raros casos, trocar até as tábuas laterais da banquinha.
Pedrinho se perguntava como ele poderia dormir sabendo que, se a banquinha do Luizinho ceder, este não consiguirá mais sustento e, logo, constituir uma família.
O problema era que Pedrinho perdia metade do seu dia ajudando Luizinho.
Joãozinho, assim como Zezinho começaram a se fazer de vítimas apoveitando da boa vontade do rapaz.
Era todos os dias pregar quadros na casa do Joãozinho, arrumar chuveiro no Zezinho, ou qualquer outra atividade que o ocupasse.
Se ele não soubesse como, ele aprenderia.

Seu tempo comecou a ficar escasso.
Mal parava na sua casa.

Sua família começou a fazer mal juízo dele.
Imaginavam que ele estava envolvido com práticas malévolas, pois estava sempre ausente.
De tudo e todos.
Quando chegava da rua, vinha cansado, mas sempre com uns trocadinhos a mais.
Pedrinho raramente aceitava alguma ajuda monetária. Mas, de vez em nunca, ele pegava porque não conseguia se esquivar de tantas insistências. E, nessas, pegava timidamente, até por precisar para os mantimentos e remédios.
Assim, seu tempo hábil para os bicos na região do vilarejo praticamente acabou.
Ele mal dava conta agora de ajudar seus conterrâneos.
Mesmo vivendo, agora com amarguras e tristeza no coração, pensava na sua família, pensava em como era útil e querido pelos amigos. Mas sua saúde não era a mesma.

Foi ficando enfermo, perdendo o que mais sabia fazer.
Ajudar.

Além eh claro, de levantar totens, pregar estantes e pintar paredes.
A Rua Treze foi ficando cada vez mais escura, até que chegou o dia em que começou a questionar sua bondade.
Sem família, sem dinheiro, sem trabalho, agora estava sem saúde.
A única coisa que ele tinha, era o mesmo que ele sempre teve.

Vontade e amigos.
Seus músculos já lembravam braços subnutridos e frágeis e, com eles ao relento, num dia de absoluta inquietação, medo, pânico e solidão, caminhou na escuridão.
Tentou achar alguém que pudesse lhe ajudar.

Queria mesmo era reencontrar sua família.
Reencontrar sua razão.

Vagou.
Tanto a casa do Joãozinho como a casa do Zezinho estavam tão bem lacradas com duas camadas de madeira, preparadas para aguentar uma avalanche de neve, que ninguém o escutou.

Ironicamente, ele estava preso, do lado de fora.
O único caminho do pequeno vilarejo nessa altura era em direção a rodoviária.
Lá, com certeza, encontraria pessoas chegando e partindo.

O único caminhho, era o caminho do vento.
Em direção do pequeno vilarejo, que mirava como alvo a banquinha do chaveiro. O conhecido Seu Luizinho.

Seria uma boa desculpa, verificar as condições das madeiras na morada do amigo e, em troca, pedir um abrigo.
Ou um abraco.

O local era muito mal iluminado, as poucas luzes daquele setor vinham somente dos ônibus saindo.

De cinco em cinco minutos um clarão refletia sua sombra caída no chão.

Ao se deparar com a morada do amigo, bateu na porta mas nao obteve resposta.
Esperou mais alguns minutos, deu treze socos com o punho fechado, cirrado e gelado, tremendo de frio, mas, novamente, nenhuma resposta.
Olhando para o chão, ficou ali, sem saber por quanto tempo até achar que seu coração tivesse sido congelado.
Eis que uma porta abriu, e a luz daquele transporte enorme fez sua retina arder.
...
Há cerca de vinte e seis metros, nao se sabe se horrendos andarilhos ou luxuosos passageiros se entreolharam.
...
Desde o início Ele já sabia.
...
Agora ficou mais fácil achar o caminho.

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